Entre o Natal e Ano Novo, um rapaz de 25 anos entrou na casa da ex-mulher no bairro Dom Joaquim, em Brusque, e atirou contra um homem de 40 anos, depois se suicidou. No local, haviam outras pessoas e a mulher relatou à polícia que seu antigo companheiro desistiu de matá-la e pediu para que se retirasse da casa antes de disparar contra a própria cabeça.

Os crimes passionais estampam noticiários e Guabiruba não está imune à violência contra menores de idade, idosos e mulheres. Segundo profissionais que atuam na área, como assistentes sociais, psicólogos, conselheiros tutelares e delegados de polícia, muitas violências são tratadas como normais ou simples brigas entre familiares.

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“Já atendemos casos de crianças que chegam com marcas na escola e quando a gente pergunta o que houve eles dizem que apanharam porque ‘aprontaram’ ou fizeram algo de errado, porém isso não é justificativa. Isso demonstra o quanto essa cultura está enraizada na população, pois até quem é vítima justifica a agressão”, explica a psicóloga Luiza Holz, que atua há dois anos na Secretaria Municipal de Assistência Social, Habitação e Emprego de Guabiruba.

Em 2019, dois casos de estupro chegaram à Delegacia de Polícia de Guabiruba, um deles continua sendo investigado e o outro a vítima voltou atrás, negando as acusações. Porém, o número de registros pode não condizer com a realidade, segundo Rosi Barbosa Serafim, delegada titular da Delegacia da Mulher de Brusque, que coordena também denúncias de violência contra mulheres ocorridas em Guabiruba.

“Infelizmente em Guabiruba não temos uma equipe específica para receber e dar seguimento às denúncias de violência contra mulher. Nossa delegacia também não funciona à noite nem aos fins de semana, sendo muitos casos registrados como ocorridos em Brusque ou, nem mesmo isso, pois a dificuldade no acesso desencoraja muitas vítimas a procurarem ajuda e denunciarem seus agressores”, salienta a delegada.

Números de Guabiruba

Em 2018, foram registrados cerca de 1,3 mil boletins de ocorrência em Guabiruba. Em 2019 os números subiram para 1,4 mil, segundo a delegada, sendo que 20% dos casos envolvem idosos e menores e 40% violência contra a mulher, cujo maioria das vítimas têm entre 16 e 38 anos de idade.

A dificuldade no acesso à delegacia e na recepção das denúncias reflete diretamente no trabalho da assistência social do município. “Nosso trabalho não é apenas entrega de sacolão ou assistência básica a famílias carentes, nós também acompanhamos famílias que passam por situações de violência e vemos a dificuldade que muitas mulheres têm ao acesso à delegacia. Tanto pela dificuldade na locomoção, pois o transporte coletivo não funciona nos fins de semana em horários recorrentes, até mesmo na dificuldade de ter uma equipe preparada para receber essa denúncia”, explica Fabiana Minsky, assistente social que trabalha há 11 anos em Guabiruba.

Outro dilema enfrentado por mulheres que sofrem violência doméstica é a dependência financeira do agressor. “Esta é uma das funções da assistência social, ajudar esta mulher a encontrar uma renda ou uma forma de se emancipar, pois a dependência financeira do parceiro faz com que ela não tenha para onde ir, muitas não têm nem mesmo familiares na região, então ou elas não denunciam a violência ou quando a fazem, acabam voltando para o agressor”, enfatiza a secretária da Assistência Social, Habitação e Emprego, Neide Luzeti Hort.

Muitos casos atendidos pela Assistência Social envolvem violência contra idosos: as principais denúncias são violência financeira, quando o cuidador ou familiar responsável pelo idoso se apropria indevidamente dos valores da aposentadoria ou do patrimônio, usando estes recursos para seus próprios interesses. “Estes casos são velados em nossos municípios porque ocorrem, geralmente, em famílias com poder aquisitivo maior, que recorrem à justiça pelo meio privado, ou seja, procurando advogados e médicos que não atuam na rede pública, o que dificulta o registro desses casos impedindo que o município tenha maior assistência para isso”, explica a assistente social Fabiana.

Violência contra menores

Quando envolve menores de idade, o Conselho Tutelar do município entra como mais uma frente da rede de assistência contra vítimas. Ao chegar uma denúncia de violência à mulher em uma Unidade Básica de Saúde, por exemplo, onde a vítima pode chegar machucada, a Delegacia de Polícia é acionada, bem como a Assistência Social, que vai avaliar quais as necessidades dessa mulher. Se a denúncia envolver menores, que estão longe da escola ou que sofreram agressão o Conselho Tutelar também é informado e tenta ajudar de alguma forma.

“Nós avaliamos caso a caso, por exemplo uma denúncia de abuso sexual, normalmente as denúncias partem de escolas, creches ou pessoas próximas da família da vítima, então nosso primeiro passo é contatar toda a rede municipal, ou seja, a Assistência Social, Saúde, Educação até mesmo para entender como esta família está na sociedade. O segundo passo é avaliar se já tiveram denúncias envolvendo esta família aqui no Conselho, comunicamos o Ministério Público e reunimos os cinco conselheiros tutelares para averiguar a melhor forma de conduzir o caso”, explica João Eduardo Wolf, um dos cinco conselheiros tutelares.

Tanto a Assistência Social quanto o Conselho Tutelar atua no acompanhamento das famílias, fazendo com que a relação entre a vítima e seus familiares se desenvolva da melhor forma. O acompanhamento também ocorre com o agressor, que muitas vezes é o responsável legal e não entende que abusou de sua autoridade. “Nós encaminhamos a família para atendimento psicológico e social e junto com o Ministério Público avaliamos as melhores formas para conduzir o caso, sempre pensando na preservação dos direitos das crianças e adolescentes”, salienta Wolf.

E quando o menor de idade é o agressor?

Muitas denúncias encaminhadas ao Conselho Tutelar apontam o menor de idade como o agressor, seja em uma briga na escola contra outros estudantes ou educadores, ou mesmo contra seus familiares. Igualmente nestes casos o órgão acompanha as denúncias junto ao Ministério Público.

“Muitas denúncias desse tipo vêm das escolas informando que um aluno agrediu outro. Nestes casos, averiguamos junto ao educandário como é o comportamento do estudante na escola, sua relação com os professores e diretoria, se foi um caso isolado ou é algo recorrente. O segundo passo é notificar a família ou responsáveis legais do menor, geralmente os problemas de agressão se estendem à família e sociedade de modo geral. Nós fazemos todo um atendimento psicológico ou psiquiátrico do menor, até para averiguar se há algum distúrbio, justamente para que ele tenha seus direitos resguardados. Mas, por mais que ele tenha seus direitos, ao agredir outra pessoa a criança ou adolescente também deverá responder por seus atos de acordo com a legislação vigente”, explica.

A maioria destes casos resulta em medidas socioeducativas em que o menor de idade presta serviços voluntários em órgãos do município, como Assistência Social e Conselho Tutelar. Estas atividades ocorrem em horários que não atrapalham os estudos do menor e são acompanhadas pelo Ministério Público e órgãos competentes.

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Onde e como denunciar?

Todos os casos de violência envolvendo mulheres, idosos e menores de idade podem ser denunciados de forma anônima através do disque 100, um serviço de proteção à crianças e adolescentes com foco em violência sexual, vinculado ao Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. 

A comunidade também pode comparecer pessoalmente à Delegacia de Polícia, Assistência Social e Conselho Tutelar e fazer a denúncia de forma totalmente anônima, bem como em outros órgãos e secretarias mencionadas na reportagem. Ao reportar violências à Secretaria de Educação e Saúde as vítimas serão orientadas sobre as medidas cabíveis, através da rede de proteção do município.

GRÁFICO VIOLÊNCIA:

2018: 1300 Boletins de Ocorrência em Guabiruba

2019: 1400 Boletins de ocorrência
Destes: 20% se refere à violência contra crianças e idosos
40% violência contra a mulher
Maioria das mulheres vítimas de violência têm entre 16 e 38 anos de idade

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