Crédito: Grazielle Guimarães

Atriz, mãe solo e defensora da arte e cultura em sua cidade natal. Aos 25 anos de idade, Jenifer Schlindwein mostra que arte e cultura tem valor e, inclusive, famílias dependem disso. A filha de Eduardo e Cleide Schlindwein é graduada em teatro pela Universidade Regional de Blumenau (FURB), hoje desenvolve papéis independentes como Dona Trude, faz parte do Trama Grupo de Teatro, é professora na Fundação Cultural de Guabiruba e apresenta o programa Café com Cuca na Rádio Guabiruba FM. A mãe da Lívia, de 4 anos, é a entrevistada do Guabiruba Zeitung desta semana.

Guabiruba Zeitung: Como foi a sua decisão de cursar e trabalhar com teatro, mesmo indo na contramão do que é comum na cidade?

Jenifer Schlindwein: Minha relação com o teatro começou aos 11 anos de idade, quando algumas atividades extracurriculares da escola envolviam esta arte. Um dia minha professora informou que alguns alunos teriam a oportunidade de se apresentar no Fecult, que era a antiga Mostra de Arte e Cultura. Eu e um colega escrevemos uma peça chamada “O Fritz e a Frida” e nos apresentamos.

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Ali eu tive minha primeira sensação de palco e plateia, porque eu soltei uma piada no texto e a plateia riu, então, foi a primeira vez de forma consciente que eu entendi que poderia provocar sensações no público, com toda a ingenuidade de uma criança, mas ali foi o maior start que eu pude ter, sabendo que aquela ação e reação era algo muito valioso, um material bruto muito especial.

A partir disso comecei a fazer mais cursos de teatro em Guabiruba, Brusque e Blumenau e paralelo a isso trabalhava com coisas que não tinham nada haver com a área. No meu Ensino Médio, entre 16 e 17 anos, eu pedi demissão e fui trabalhar como secretária do Sidnei Baron, na Fundação Cultural, e contei para os meus pais que era isso que eu queria fazer, inclusive, de faculdade. Realmente foi um choque muito grande, até hoje eles têm algumas restrições para entender que o que eu faço é profissional e não apenas lazer. Pode ser lazer para quem usufrui, mas para mim é trabalho.

Permanecer aqui na cidade se tornou um propósito, pois se eu saio daqui quem vai fazer arte aqui? Nunca vai ter ninguém que vai ficar e enfrentar os problemas sociais? quem vai implementar teatro no município?

GZ: Como você avalia o crescimento da cultura na região, especialmente em Guabiruba?

JS: A cultura aqui é forte porque existe um coletivo que realmente se une e faz, mas também porque tem uma monetização dessa cultura, que gera emprego, renda e um retorno financeiro para muitas famílias. Porém, o fazer arte e cultura já existe há um tempo na região. O Paixão e Morte existe há muitos anos, o espetáculo é uma referência, mas essa evolução vem de um trabalho constante em formar plateia, pois o público atual é uma moeda de dois lados, pois são espectadores que vão quando convém e vai de encontro ao que se gosta tradicionalmente e não comparecem quando é algo diferenciado, ou está no início, é um jogo de equilíbrio.

Dependendo da temática do espetáculo, o público não comparece, então a formação da plateia é constante e eu vejo que está melhorando muito, porque a parceria entre a Fundação Cultural, Prefeitura e outros órgãos solidifica este setor, com isso associações como a São Pedro ganham destaque para outras pessoas que querem ingressar na arte. São atitudes como essas que permitem o acesso dos artistas para se solidificarem na cidade e em contrapartida devolverem um produto para essa população. Não dá para achar que cultura se faz sozinho, é tudo coletivo, e quando se entende isso o caminhar para frente é mais fácil.

GZ: Quais os principais desafios de ser mãe solo?

JS: Eu tento guiar e educar a Lívia pelo caminho da arte e da cultura, pois devido a minha profissão ela sempre está presente e inserida nesse universo. No fundo eu sempre brinco na minha cabeça que nós duas somos a Fernanda Montenegro e a Fernanda Torres, pois a Montenegro sempre conta que levava a filha dela para as coxias do teatro e a Torres foi aprendendo ali como um ser humano se socializa, faço um pouco disso com a Lívia, de forma bem natural, sem forçar nada.

Ser mãe solo é um tabu muito grande aqui. Percebo muitos olhares tortos, uma estranheza, parece que as pessoas enxergam nossa relação como se faltasse algo, porém não está faltando, é uma realidade apenas, não há um buraco que alguém precisa entrar para preencher. Mas eu não tenho medo nem vergonha de nada porque se a proposta é viver em sociedade eu embarco nesse trem e vou.

Graças a Deus eu tenho a minha família ao meu lado e pessoas incríveis que entendem e colaboram para essa criação da Lívia, porque isso não é feito sozinho, não dá para pegar a pressão de ser mãe só para você e levar isso tudo sozinha. Antes de ser mãe nós somos mulheres de uma forma completa, que têm vida social, profissional, não dá para simplesmente se anular no meio da maternidade e muitas vezes esse é o tabu, porque pode ser que muitas mulheres sintam isso, mas não falam. Esse é o sufoco da maternidade, pois é um padrão que se segue. Nós não somos perfeitas e eu me livro dessa carga de ser uma mãe perfeita e estar certa sempre.

GZ: O que você espera do próximo governo municipal?

JS: A comunidade artística leva a fama de “os vagabundos de esquerda”, mas como pertencente dessa comunidade e artista de Guabiruba, eu realmente me coloco em um lugar imparcial e manifesto a minha torcida para aquele que realmente vencer por maioria de votos amplie sua visão de cultura e perceba que não é meramente entretenimento, a arte gera emprego, lazer, retorno econômico, turismo, são pontos que se ligam.

A cada novo governo surgem inúmeros medos e dúvidas, porque na primeira necessidade de corte, a cultura é a primeira que sofre. Assim como essa gestão, que demonstrou estar preocupada com a cultura, espero que a próxima mantenha isso, entendendo que pessoas trabalham, estudam e têm famílias que dependem da arte.

GZ: Quais são seus sonhos e projetos para os próximos anos?

JS: Globo né? [risos] brincadeira! TV nunca foi minha pretensão, eu sou apaixonada pelo palco do teatro, por essa relação com a plateia, mas ainda me vejo em observação. Às vezes eu gosto mais de dirigir, às vezes mais de atuar. Hoje, a Dona Trude é o meu maior foco, estou muito concentrada na evolução da personagem, que traz uma crítica social por trás de suas falas. Com a Dona Trude eu me aproprio da minha cultura, mas retorno com uma crítica construtiva desta sociedade e não apenas com piadas vazias.

GZ: Qual a situação mais difícil que você enfrentou na profissão?

JS: Uma das situações mais chatas que eu enfrentei foi a de um curta metragem que eu participei em 2017, com uma produtora de cinema de Brusque, em que o filme se chamava “vermelho unisex”. Este filme foi realizado com uma equipe muito profissional, foi feito um teste de elenco, passei no teste, e eu interpretava uma das partes de um casal, o filme era para maiores de 18 anos e tinha conteúdo de nudez.

Neste ano, algumas pessoas de Guabiruba tiveram acesso ao filme, apesar de eu nunca tê-lo escondido, inclusive ele está no meu portfólio, mas algumas dessas pessoas, com muita malícia tiraram print apenas da cena de nudez e compartilharam no WhatsApp, como se eu fosse uma atriz pornô. Isso chegou aos meus ouvidos depois de muito tempo dessas imagens rolando na cidade, foi bem difícil, acabou prejudicando a minha imagem.

Já tenho um pouco de consciência de como as coisas funcionam aqui e fiquei na minha, procurei uma advogada para saber dos meus direitos, fiz um Boletim de Ocorrência e um vídeo super didático sobre o filme com pessoas da equipe explicando o meu trabalho, porém isso me desmotivou um pouco. Esse preconceito e machismo velado foi algo muito difícil.

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