“Eu trabalhava como motorista de caminhão viajando entre a Venezuela e o Brasil, certa vez recebi meu salário e troquei em dólares, cerca de US$ 400, fui parado pelos militares na fronteira, eles me revistaram e mesmo não encontrando nada de ilegal disseram que se eu não quisesse ficar preso teria que dar parte do dinheiro para eles”. Esta é apenas uma parte do relato do refugiado venezuelano Ivan Maduro, 27 anos, que há quatro meses reside em Brusque e trabalha em Guabiruba.
A crise que afeta diversos países da América Latina chegou de forma ainda mais brutal na Venezuela em 2013, com eleição de Nicolás Maduro e a perpetuação de seu mandato válido até 2026. Milhares de venezuelanos se sentiram obrigados a sair do país em busca de uma vida minimamente digna. “Lá na Venezuela há filas enormes no supermercado, mesmo faltando muitas coisas as pessoas fazem fila para pegar o mínimo. Falta dinheiro, empregos, remédio, tudo. O antigo presidente, Hugo Chávez, se preocupava com os pobres, mas o Maduro não”, conta Rosaine Centena, 23 anos, que trabalha no mesmo restaurante que Ivan.
Antes de chegar em Brusque, cidade onde os dois residem, Rosaine passou cinco meses em Manaus, onde há uma base de abrigo para refugiados. Já Ivan ficou apenas poucos dias ali, local em que os dois receberam alimentação, medicamentos e puderam fazer os documentos brasileiros como carteira de trabalho, CPF e RG. “Meu cunhado conhecia bem a região aqui e disse que poderia nos ajudar, então pegamos uma balsa de Manaus até Belém e de lá viemos no caminhão dele até aqui. O patrão do meu cunhado conhecia o dono do restaurante e nos indicou para o trabalho”, explica Rosaine.
Adaptação brasileira
Os dois amigos se mostram felizes em estar no Brasil. Rosaine já tem o português mais desenrolado, se comunicando com mais fluidez. “Em Manaus eu trabalhei numa padaria, fiz um curso de português, então para mim é bem mais tranquilo trabalhar atendendo as pessoas”, salienta.
Ivan mostra dificuldade com algumas palavras, mas consegue se comunicar no português, saindo até algumas brincadeiras. “Apesar do meu sobrenome ser Maduro, não tenho nada haver com o presidente. Ele é de origem colombiana e meu avô da holandesa, então não me confundam”, brinca.
Os dois moram no bairro São Pedro, em Brusque, e trabalham pela manhã no restaurante como freelancers e estão procurando trabalho à tarde para completar a renda. Segundo José Antonio Schumacher Júnior, o Toni, chefe dos dois, a ajuda veio em boa hora.
“Eu estava precisando de um reforço para fim de ano quando eles apareceram. Conheci através de um amigo, que também emprega um deles. Os dois são muito educados e aprendem rápido. O Ivan estudava astrofísica na Venezuela, é muito inteligente e tem interesse em aprender”, conta.
A situação dos dois sensibilizou Toni. “Eles vieram com poucas roupas, estavam em uma situação precária, ficaram três dias sem comer na balsa de Manaus para Belém, agora estão melhor”, destaca.
Família venezuelana
Grande parte da família dos dois amigos estão na Venezuela, apesar da situação difícil, os mais velhos resistem à ideia de sair do país. “Eles preferem que mandemos ajuda para eles, porque temos casas lá, não querem abandonar tudo por completo”, conta Rosaine.
Ivan pretende trazer a namorada. “Toda minha família está na Venezuela, mas muitos não querem sair de lá, preferem ficar. A Venezuela é muito rica, tem muito gás e petróleo, mas está sob o governo de pessoas desonestas, que não pensam nos pobres. Os militares são contra as pessoas, não importa se são mulheres, jovens ou crianças. São inúmeras injustiças que fazem as pessoas do país sofrer com a fome e a necessidade de tudo”, conta.