Pelznickel IX – Como nasceu o Papai Noel que o mundo ocidental conhece hoje

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Ao se referir sobre as comemorações natalinas, o pesquisador alemão Lothar Wieser informa que o costume do personagem “Belzenickel” ou Pelzinickel e do servo Ruprecht deve ser muito antigo, pois existem indicações da expressão relacionadas aos “Alemães da Pensilvânia” que emigraram no século XVIII do Palatinado para a América do Norte . E o artista Thomas Nast, emigrante alemão de Landau (Renânia-Palatinado, Alemanha), é considerado o criador da figura do Nicolau e responsável pela popularização do personagem (WIESER, 2018).

Hoje, no mundo ocidental as crianças conhecem o Papai Noel gorducho, de barba branca, roupa vermelha e bota preta, mas possivelmente poucos conhecem a sua origem. E tampouco o seu inventor palatino dificilmente teria sonhado com isso. Conta-se que, para criar o personagem, Thomas Nast se inspirou numa foto do “Belzenickel” (na verdade, numa foto do servo Ruprecht) tirada em sua antiga casa, em Landau. No final do século XIX foi publicado, no “Novo Mundo”, uma coleção das obras natalinas de Nast, mas o seu desenho mais famoso, “o Papai Noel”, só se tornou conhecido mundialmente em 1931, a partir da adaptação do personagem para anúncios da Coca Cola, numa campanha publicitária que acabou por transformá-lo num símbolo mundial de Natal, e fazendo de Thomas Nast o “Pai do Papai Noel” (SWR, 2018).

Mas, afinal, o que é Pelznickel na cultura popular de Guabiruba?

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O Pelznickel é, antes de tudo, uma identidade do povo guabirubense. Algo que só quem cresceu em Guabiruba realmente consegue compreender. Os demais, talvez definam o Pelznickel como “Papai Noel do Mato”; “Monstro Assustador”; “Bicho Feio e Chifrudo”, um personagem que aparece anualmente em desfiles pelas principais ruas de Guabiruba durante as festividades de Natal entre os dias 6 e 24 de dezembro.

O autor Piazza, ao escrever sobre as festividades natalinas em 1960, dizia que em Brusque e Guabiruba, além do São Nicolau, era comum certos tipos populares trajarem-se com trapos e, conduzindo pesadas correntes, representavam o Pelznickel, para atemorizar a garotada. O que, de certo modo, consistia num preparo psicológico para o Natal, como que avisando: os bons serão premiados e os maus esquecidos, de modo semelhante ao descrito por Engel (2018) sobre o Pelznickel de Peritiba.

Jose Siegel contou a Fabiano Siegel sobre o Pelznickel: “Quando eu era criança era comum ter medo dos Pelznickel. Eu sempre desconfiava que o pai era um, porque ele sempre ia muito para o mato (ele ia para caçar), mas mesmo assim, tempo de Natal, a gente espiava para onde ele ia (para o mato). Lá em casa tinha um sótão no rancho onde a gente não podia subir. E só depois de muito tempo foi que descobrimos que era lá que ele guardava as roupas dos Pelz. No tempo de Natal, o que a gente ganhava eram doces, e adorávamos isso, e já começava no dia de São Nicolau, dia 6 de dezembro. Os nossos presentes eram de madeira e feitos por nossos pais mesmo, eu lembro que ganhei uma espingarda que mais parecia ser um galho, e quem trouxe foi o Pelznickel no dia 24 de dezembro, mas antes de ele chegar eu já tinha me escondido porque eu tinha provocado eles (Pelznickel) ali na (casa da) Tante Dietrich”. José Siegel finalizou a entrevista dizendo: “mas nunca soube se o meu pai era Pelznickel mesmo, acho que esqueci de perguntar, mas creio que sim, por causa das roupas, que depois eu até usei uma delas”.

Para o empresário Ivan Fischer, presidente da Sociedade do Pelznickel, o personagem é portador de um caráter educacional, e por causa dele muitas crianças obedecem aos pais (FISCHER apud CERBARO, 2009). É comum presenciar a promessa de bons modos na ponta da língua, não só em crianças, mas também em adultos ao se defrontarem com o Pelznickel.

Mas uma coisa é fato: cada Pelznickel é único e se renova ano após ano. O traje é preparado pelo próprio Pelznickel. Usam-se trapos e roupas velhas nas quais são costuradas folhas de uma espécie de palmeira comum em Guabiruba, de folha larga, chamada Geonoma Gamiova (popular palheira). Nos trajes também se costuma usar barba-de-velho (Tillandsiausneoides) – uma bromélia que vive em árvores ou em outros substratos inertes – e que existe em abundância em Guabiruba.

Significado da palavra Pelznickel

Existem, no mínimo, duas definições para o nome Pelznickel. A Sociedade do Pelznickel explica que o nome Pelznickel significa: Pelz: pelos, pelagem. Nickel: diminutivo de Nicolau (Blog do Pelznickel, 2018). Assim, Pelznickel também poderia ser traduzido como “Nicolau Peludo”, no dialeto badense, falado em Baden – Alemanha – de onde imigraram os colonizadores de Guabiruba.

O pesquisador alemão Lothar Wieser (2018), por sua vez, informa que, etimologicamente, a palavra Pelznickel deriva do alto-alemão médio “pelzen” e significa: bater, dar pancadas. Mas, independentemente da tradução que se dê ao nome Pelznickel – cada um deles sempre vai ser exclusivo, pois dentro do Pelznickel existe um ser humano único.

A aparência do Pelznickel

A aparência do Pelznickel costuma ser assustadora e alguns trazem chicotes, varas e correntes nas mãos. Alguns tem chifres e outros trazem chupetas e/ou mamadeiras amarradas pelo corpo. Ao se referir à questão estética do Pelznickel, Engel (2018) conta que em Peritiba ele se apresentava com vestes variadas, simples como a vida rural, e uma indumentária que incluía itens como uma grande capa – espécie de sobretudo -, ou um poncho, um velho chapéu, um pelego, barbas longas improvisadas e botas.

Alisson Sousa Castro (2015) ao se referir à parte estética que envolve o personagem, afirma que a aparência do Pelznickel (de Guabiruba) lembra a de um terrível monstro – de um ‘bicho chifrudo que vem do mato’. Ele diz que o material utilizado para a confecção de sua vestimenta sugere, a princípio, que foram adaptados materiais locais no lugar de peles de animais. Seu traje é composto por uma vestimenta feita geralmente de trapos e/ou barba-de-velho – na Rua São Pedro -, ou folhas de gamiova – na Rua Guabiruba do Sul.

Fabiano Siegel descreve assim a estética do Pelznickel: “ornado com chifres na cabeça, portando chicote, corrente ou vara nas mãos, pode também levar adereços como sinos ou mesmo chupetas infantis – sugerindo condutas a serem abandonadas pelas crianças”. E, ainda: “muitas pessoas chegam a Guabiruba, vindas de outros lugares e não conhecem a nossa tradição. Elas podem se assustar e até pensar que somos bagunceiros e que queremos deturpar o Natal. Mas nosso objetivo é manter preservada essa cultura. É algo sério e nosso”. Na visão de Siegel, “medo e respeito caminham juntos, e o Pelznickel tem um caráter educacional” (SIEGEL apud CERBARO, 2009; MACHADO, 2010). E, assim, a tradição do Pelznickel foi sendo transmitida de geração em geração até que foi criada a Sociedade do Pelznickel.

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